Provavelmente está na hora de parar de levar a guerra e a economia de mercado para populações famintas e sem esperança que recorrem e confiam em Deus para começar e terminar cada dia.

As pessoas que não tem o que perder podem ser muito perigosas.

O primeiro ataque inimigo ao território dos EUA, depois da segunda grande guerra, marcou a historia com as imagens mais impressionantes deste século. O avião de passageiros entrando e se dissolvendo no prédio do World Trade Center transformou um ícone pelo outro. Mudando o que era sólido em imagem efêmera, desmanchada no ar e impressa a fogo na lembrança de toda uma geração.

Mais de três mil pessoas morreram nos ataques a Nova York e ao Pentágono, em Washington. Vítimas a lamentar do especimem predador, vivo em todos nós, que por medo instintivo e espaço vital, reage e mata. A imprensa cheia de artigos explicando e interpretando olha perplexa e pergunta: nós somos isso? A resposta crua é: sim, somos isso.

Toda a civilização do planeta, o avanço da ciência, a mais bela Carta Constitucional do mundo, que é a norte-americana, todo o retorno ao fortalecimento do espírito, todas essas qualidades, praticadas pela maior parte da humanidade, são reduzidas a quase nada em acontecimentos como esses. Nenhuma alma será salva se todas não forem salvas, rezava o padre da minha infância. O mundo não explode por que a maioria das pessoas segue o caminho da bondade e tolerância. Existem mais pessoas boas que más. Mas, a maldade pode ser elevada a uma forma de arte, como dizia a canção.

E apesar do suspiro paciente dos meus amigos ao lerem isso, não posso deixar de pensar em Glauber Rocha, do seu Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro. Impossível não citar Heráclito, com o bem e o mal sendo as faces de uma moeda em permanente rotação. Nem de lembrar Nietzsche, reconhecendo a busca pelo poder como parte do destino humano.

Mesmos os ateus tem que reconhecer que este planeta, uma espécie de paraíso celeste, azul, tem seus seres permanentemente dizimados por ocorrências titânicas, naturais e cósmicas. Vulcões e meteoros, terremotos e maremotos. Civilizações e espécies surgem e desaparecem. Forças telúricas em permanente batalha justapõem o bem e o mal exatamente da forma que as religiões descrevem.

Em que estágio dessa estrada estamos em relação aos Maias, aos Anassassis, aos Incas, Astecas e aos Celtas? São nossos monumentos de aço mais frágeis que as pedras dessas civilizações antigas, ou é nosso fogo destruidor muito mais poderoso?

Onde estão estas civilizações e que lições restam delas? Através dos satélites e dos computadores nos chegam as notícias dessa nossa época demonstrando que continuamos guerreiros sanguinários, que o sacrifício humano é permanente na historia e que o canibalismo de criancinhas é executado não literal, mas virtualmente pela máquina cultural-econômica, que prefere achar que a África não existe.

A sociedade anônima acabou com a culpa do mandatário, dissolvendo a responsabilidade pessoal e atribuindo ao ambiente do mercado a função de tornar a viável a sobrevivência, distribuir oportunidades e riquezas. Faz isso muito mal. É um processo de acumulação por exclusão que gera um fator imponderável de convulsão social. É como se mais de 2.000 anos de conhecimento da historia não servissem para nada.

Há um fator de perda de poder coercitivo dos Estados pela guerra. Levaram a guerra tão a sério. Elevaram o poder de destruição ao nível da “retaliação mútua assegurada”, significando que países com capacidade nuclear podem destruir uns aos outros e ao mundo. Logo, ninguém mais quer isso. Assim, a guerra passou a ser localizada e de guerrilha.

Os Estados Unidos e aliados, venceram a guerra mundial. Vencedores e perdedores tornaram-se as nações mais fortes do planeta e criaram um império planetário comandado pelo G-8 (Grupo dos 8 países mais ricos, agora incluindo a Rússia). Os resto do mundo virou terceiro mundo, nações emergentes ou periféricas. Os Estados Unidos também venceram a guerra fria e conquistaram o direito de tornar-se o primeiro país da nova historia a prosperar e enriquecer mesmo com gigantesco déficit público e comercial.

Os Estados Unidos, terra da bravura e da liberdade, detentor da Carta Constitucional mais perfeita em termos de direitos individuais, tem exportado para o terceiro mundo os piores tiranos, as piores violações de direitos individuais e promovido a defesa, através da sua máquina militar, da mais obscurantista linha de pensamento político e social do planeta.

Ignorância, falta de visão, arrogância e descaso com as informações do seu próprio serviço de inteligência, mantiveram os Estados Unidos apoiando o Xá da Pérsia (na verdade um militar interessado em criar uma dinastia) até o povo derrubar o Governo, farto da crise social e moral do país, e estabelecer o primeiro Governo fundamentalista Islâmico dessa fase atual da historia do planeta.

O que veio depois foi a guerra do Vietnam, onde a guerrilha venceu os Estados Unidos. A operação Condor na América Latina. O bombardeio ao palácio da La Moneda, no Chile, em 11 de setembro de 1973, matando Salvador Allende. A Nicarágua e os Contras, financiados pelo norte-americanos em operação que tornou-se escândalo internacional, por envolver tráfico de drogas, e defender o ditador Somoza. Operações terríveis foram financiadas e apoiadas na Guatemala. Fechando com chave de ouro essas ações na América Latina temos o General Noriega, ex-presidente-homem-da-CIA, depois preso como traficante internacional de cocaína, hoje residente em prisão federal norteamericana.

Portanto, não chega a ser uma surpresa que o culpado apontado pelo ataque injustificável ao território norte-americano seja Osama-Bin-Laden, em outros tempos apoiado pela CIA para lutar no Afeganistão contra a ocupação Soviética.

O pano de fundo é a difícil situação social e econômica a que foi reduzida a maior parte da população do mundo Islâmico. Detentores de uma cultura sofisticada e avançada, enquanto a Europa medieval era semi-bárbara, as populações Islâmicas estão entre as excluídas do terceiro mundo e oprimidas por regimes tirânicos.

Apesar da sua extrema visibilidade não é o conflito Palestino-Judeu a questão política mais relevante. É a exclusão social e política em que vivem essas milhões de pessoas, detentoras de cultura milenar e acostumados ao sacrifício e à resistência.

Mesmo assim é a desigualdade de forças do conflito Palestino que estimula a criação de um exército místico, numa guerra onde a morte é vitória e não derrota. Como vencer essa idéia?